Catherine Pégard, Presidente do Estabelecimento Público do Palácio, do Museu e da Propriedade Nacional de Versalhes
Jean-François Chougnet, Comissário da exposição
Jean-François Chougnet
Comissário da exposição
A abordagem da artista portuguesa Joana Vasconcelos, nascida em Paris em 1971, inscreve-se na reapropriação de objetos do quotidiano, que se esforça em transformar recorrendo a técnicas inventivas e inesperadas. Esses choques e deslocações estão na origem de obras híbridas, quer realizadas com azulejos, quer com croché – palavra francesa apropriada e amplificada pela prática das mulheres portuguesas - são cosidas, soldadas, douradas... Numa palavra, o objeto de uma metamorfose.
Com efeito, Joana Vasconcelos pretende criar um diálogo entre a cultura e a história pessoal, questionando simultaneamente o conceito do belo, sem cair na armadilha do kitsch e sem reivindicar um Neodadaísmo. Para evitar essas armadilhas, a artista recorre a uma arma poderosa: o humor. Crítico, e por vezes mesmo cínico, o humor serve-lhe para tornar claro e divertido o discurso à volta da sua obra. Joana Vasconcelos parte dos clichés tradicionais do seu país para os revisitar com esse humor, como ainda, de modo subjacente, com um olhar divertido um pouco triste, por vezes um pouco inquietante, desiludido e muito moderno. Profundamente ancorada na cultura portuguesa, utiliza, portanto, uma linguagem percetível por todos. Podemos obviamente cair na tentação de acrescentar outro cliché português, frequentemente citado, mas nunca realmente compreendido, a Saudade. Muitas das suas obras são marcas de uma sensualidade feminina calorosa. Deparamo-nos então com uma reivindicação feminina, sem dogmatismo, mas tratada num tom mais irónico do que militante.
Não encontramos nenhuma provocação gratuita na obra. Deste modo A Noiva, com a qual se fez conhecer na Bienal de Veneza - esse grande lustre constituído por tampões higiénicos, que proclamam a feminilidade, o “pecado original”, ao mundo.
E Versalhes nisso tudo? A obra de Joana Vasconcelos apenas pode entrar em ressonância com essa dualidade que está na base do projeto de Versalhes, essa ambivalência entre o clássico e o barroco, elucidada por Louis Marin. Versalhes seria o resultado de uma produção, de uma construção simultaneamente real, simbólica e imaginária. “Imaginário: revela o desejo ‘barroco’, fantástico, fantasmático de (se) mostrar o poder absoluto”. Trata-se de um atalho curioso da história se pensarmos no facto de que o termo português “barroco” designava uma pérola com forma irregular.
Versalhes por Vasconcelos é, ainda, uma série de Valquírias, na Galeria das Batalhas, peça central do museu dedicado “A todas as glórias da França” pelo rei Luís Filipe, as quais Delacroix, responsável pela realização da Batalha de Taillebourg, qualificava como “bizarras galerias”. O percurso dos “Grands appartements” (grandes aposentos) será o cenário das produções divertidas e irónicas da artista, primeira mulher artista convidada pelo Palácio.